sexta-feira, dezembro 08, 2006

 

O paradoxo do Mal - I

A formulação clássica do paradoxo do mal, da autoria de Epicuro, é a seguinte:

«Quer Ele [Deus] impedir o mal, mas não pode? Então é impotente. Pode, mas não quer? Então é malévolo. Não quer nem pode? Porquê adorá-lo? Será que pode e quer? Então não pode existir mal»


Já que o mal existe, e já que a impotência é incompatível com a omnipotência, este paradoxo demonstraria que a crença num Deus como o da mitologia judaico-cristã, alegadamente benévolo e omnipotente não faria sentido.

A teologia cristã deu uma resposta a este aparente paradoxo. Alegadamente o mal surge porque Deus nos dá liberdade. E nós, seres humanos, muitas vezes usamos essa liberdade para o mal.
Neste caso, Deus pode mas não quer intervir, não porque seja malévolo, mas sim porque respeita a nossa liberdade.


Peço a todos os leitores que notem algo a respeito deste argumento. Existe uma premissa implicitamente assumida, necessária para a coerência da refutação, que seria interessante analisar.
Estas considerações não rebateriam o paradoxo de Epicuro se fosse possível a um Deus respeitar a liberdade humana e evitar o mal. Sendo Deus alegadamente omnisciente e omnipotente, o facto de encarar essas duas condições como inconciliáveis quer dizer algo de muito profundo a respeito da liberdade! Quer dizer que se encara um mundo livre como algo que não pode ser conciliado como um mundo onde o mal não existe. Nem um Deus omnipotente poderia conciliar essas duas realidades.
Quer dizer, não apenas que se considera a liberdade como a fonte do mal por razões conjunturais, mas que se considera que essa é de tal forma a natureza intrínseca da liberdade, que nem um Deus omnipotente poderia criar um mundo em que isso não fosse assim.

Realmente as religiões sempre foram inimigas da liberdade, mas é curioso observar que, a par de tantas declarações explícitas dos teólogos e Papas cristãos contra a liberdade e o livre-pensamento, nas próprias crenças a respeito da origem do mal se encontra esta inimizade implícita.


Com todas estas considerações não rebati o argumento. Eu creio que o paradoxo apresentado por Epicuro faz sentido, enquanto que crença num Deus omnipotente e benévolo não. Mas não é por mostrar que a refutação mais comum a esse paradoxo tem implícita uma ideia extremamente negativa a respeito da liberdade, que ela deixa de fazer sentido.

Por esta razão, pretendo escrever quatro artigos com argumentos diferentes que pretendem demonstrar, cada um por si, que esta refutação é falha. Que o paradoxo de Epicuro permanece irrefutável, e que a crença num Deus omnipotente e benevolente não é racional.




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