sexta-feira, abril 14, 2006

 

Eu também concordo com o arcebispo

Como foi indicado pelo Ricardo Alves, Lawrence Saldanha, arcebispo católico de Lahore, lidera a campanha pela abolição do delito de blasfémia no Paquistão. O arcebispo, que preside também à Conferência Episcopal católica do Paquistão, defende a revogação dos preceitos B e C do artigo 295º do Código Penal paquistanês, que criminalizam a crítica do Corão e de Maomé, respectivamente.

Este artigo, introduzido em 1988, tem sido utilizado como desculpa para perseguir cristãos neste país, queimar igrejas e assassinar blasfemos, bastando para isso que se ululem acusações de blasfémia e se produza um Corão «vandalizado».

O caso mais recente de blasfémia é uma paquistanesa cristã, Naseem Bibi, descrita como tendo atraso mental, que foi acusada de vandalizar uma imagem da Kabah, o templo sagrado do Islão na Arábia Saudita. A acusada, confinada á solitária e sem direito a fiança, aguarda julgamento em completo isolamento. O marido e os filhos foram forçados a sair de casa com medo de retaliação por parte de extremistas muçulmanos.

Esperemos que a história de Naseem não termine como a de uma sua homónima igualmente acusada de blasfémia, que morreu na cadeia em 2003, enquanto aguardava julgamento.

A Comissão de Direitos Humanos do Paquistão manifestou então a sua preocupação pelo número elevado de acusados de blasfémia que morriam nas prisões em circunstâncias no mínimo suspeitas, quando não configuravam claramente assassinatos.

Para a minha moral ateísta e humanista criminalizar a blasfémia é uma abominação comparável a outras abominações do passado, sancionadas e defendidas pelas religiões, como seja a escravatura. Aliás o próprio conceito de blasfémia é em si uma abominação anacrónica, que nesta altura e no rescaldo da guerra dos cartoons, ameaça as próprias fundações da nossa civilização ocidental.

Mas a Igreja Católica que tanto se indigna com as leis da blasfémia em locais onde é minoritária, carpindo a alto e bom som os «mártires» da intolerância alheia, nos países onde é maioritária clama que «O respeito pelo sagrado é algo que a cultura não pode pôr em questão, mesmo em nome da liberdade».

Cultura democrática assente na liberdade e respeito pelos direitos humanos, que incluem o direito à blasfémia, e cultura democrática que segundo Ratzinger é um erro que nos conduziu ao «abismo» actual. Aliás, opinião que os católicos presentes no vergonhoso Prós& Contras de segunda-feira repisaram à exaustão (a propósito do programa, recomendo vivamente este post). Segundo o nosso cavaleiro da pérola redonda, numa prestação que ultrapassou todos os limites do decoro, paladino da moral e bons costumes que respeita os terroristas que chacinam infiéis em nome da religião, a suposta decadência europeia deve-se exactamente aos princípios básicos da democracia e à laicidade.

Apenas a laicidade e concomitante liberdade de expressão garantem a liberdade religiosa de todos, no Paquistão ou em qualquer local do mundo. Liberdade de expressão e laicidade em que assestam as baterias dos fundamentalistas de todas as religiões nos países em que são maioritários e que incoerentemente, como tudo nas religiões, defendem nos países onde são minoritários!




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