quinta-feira, maio 04, 2006
Terras da Beira
São cada vez mais os mortos que povoam os cemitérios e menos os vivos que ficam. Os jovens saíram pelas estradas que invadiram o seu habitat. Fugiram das courelas que irmãos disputavam à sacholada e à facada, dos regatos que secaram a caminho das hortas, da humidade que penetrava as casas e os ossos e da pobreza que os consumia.
Não há estímulo para permanecer. Não se percebe que as penedias tivessem custado vidas na disputa da fronteira, que homens se tivessem agarrado aos sítios e enchido de filhos as mulheres que lhes suportavam o vinho, a rudeza e os maus-tratos.
Os tempos mudaram e os campos, abandonados, são pasto de chamas que lhes devoram os arbustos, no estio, e os entregam à erosão.
Os funerais são o momento de fazer o recenseamento dos que resistem. Nas missas, os padres em via de extinção debitam com ar sofrido a homilia, com pressa de passar à paróquia seguinte e sem coragem para falar do Inferno. Ora, sem medo, sem ameaças e sem convicção não há fé que resista ao ar lúgubre de uma igreja, ao frio do lajedo e às imagem abonecadas que substituíram as antigas que rumaram aos antiquários.
Falar de castidade a quem a idade condenou, dos malefícios do aborto a quem passou há décadas a menopausa e na obrigação de aceitar os filhos que Deus mandar a quem já não é capaz de os gerar, é persistir em rotinas que a desatenção e a demência cultivam.
Há dias fui à Beira onde nasci. São poucas as pessoas que ficaram e Deus, na sua eterna ficção, aparece apenas como pretexto para arejar umas imagens que adejam em padiolas, com um velho padre que tropeça sob o pálio erguido por braços frouxos que ameaçam deixar-lho cair em cima, enquanto carrega a custódia.
Por hábito, e bem parecer, enquanto uns ruminam orações, outros vão na procissão para acertar o preço da vaca ou das ovelhas de que querem livrar-se. A fé desfez-se com o tempo e a bíblia, que tanto medo infundia, enfeita o altar e apara as cagadelas das moscas que ornamentam as páginas do Levítico.
Não há estímulo para permanecer. Não se percebe que as penedias tivessem custado vidas na disputa da fronteira, que homens se tivessem agarrado aos sítios e enchido de filhos as mulheres que lhes suportavam o vinho, a rudeza e os maus-tratos.
Os tempos mudaram e os campos, abandonados, são pasto de chamas que lhes devoram os arbustos, no estio, e os entregam à erosão.
Os funerais são o momento de fazer o recenseamento dos que resistem. Nas missas, os padres em via de extinção debitam com ar sofrido a homilia, com pressa de passar à paróquia seguinte e sem coragem para falar do Inferno. Ora, sem medo, sem ameaças e sem convicção não há fé que resista ao ar lúgubre de uma igreja, ao frio do lajedo e às imagem abonecadas que substituíram as antigas que rumaram aos antiquários.
Falar de castidade a quem a idade condenou, dos malefícios do aborto a quem passou há décadas a menopausa e na obrigação de aceitar os filhos que Deus mandar a quem já não é capaz de os gerar, é persistir em rotinas que a desatenção e a demência cultivam.
Há dias fui à Beira onde nasci. São poucas as pessoas que ficaram e Deus, na sua eterna ficção, aparece apenas como pretexto para arejar umas imagens que adejam em padiolas, com um velho padre que tropeça sob o pálio erguido por braços frouxos que ameaçam deixar-lho cair em cima, enquanto carrega a custódia.
Por hábito, e bem parecer, enquanto uns ruminam orações, outros vão na procissão para acertar o preço da vaca ou das ovelhas de que querem livrar-se. A fé desfez-se com o tempo e a bíblia, que tanto medo infundia, enfeita o altar e apara as cagadelas das moscas que ornamentam as páginas do Levítico.
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