segunda-feira, agosto 15, 2005

 

Momento Zen da segunda-feira

João César das Neves (JCN) raramente desilude os leitores. À segunda-feira prega-nos a habitual homilia com as graças do seu Deus, e respectiva família, e execra os hereges que desprezam tão sagrada gente e os mitos que lhe estão associados.

A pérola da semana tem por título «Um tempo salvo por uma mulher», em cujo exórdio se lê: «O nosso tempo só admira e cultiva o paganismo porque não faz a menor ideia do que ele fosse, conhecendo apenas as modernas imagens parolas».

Diz-nos que «Santa Maria Madalena é uma das maiores santas da nossa história», sem indicar o catálogo dos milagres ou fazer uma resenha das virtudes. Nem sequer refere a actividade profissional da dita, antes de se dedicar em exclusivo a Jesus Cristo (JC).

Depois, como bom conhecedor da bíblia, refere imagens eróticas e fala da crueldade dos deuses pagãos como se falasse do deus abraâmico.

Vale a pena transcrever a frase onde descreve a religião: «É horrível viver a vida com a omnipresença de deuses, espíritos e demónios, que dominam todos os elementos e se tornam vingativos se não forem alimentados por libações». Basta substituir libações por orações, colocar deus no singular e temos o Deus da ICAR.

Sendo o cristianismo, sobretudo a versão terrorista da ICAR e a de alguns evangélicos, a expressão do pior que JCN atribui ao paganismo, é curioso que nos diga que JC nos libertou de tudo isso.

Diz ainda JCN que JC falou do Seu Pai [sic] (do de JC, o de JCN é posterior), «o único Deus, o Deus que é bom e próximo e ama sobretudo os pobres». Esta arrogância de o Deus de JCN ser melhor do que o Deus dos suicidas islâmicos ou o dos judeus com tranças à Dama das Camélias aceita-se, mas o facto de ser o único, é o beato a desejar o monopólio.

Para provar a consideração que a ICAR tem pela mulher, não se baseia no número de padres, bispos ou papas que a ICAR ordenou, mas no número de santas que fabricou.

Não refere as que a Inquisição queimou como bruxas, a obediência a que as condena ao homem, a conduta misógina e a impureza que a ICAR imputa à mulher, ao ponto de falsificar uma virgindade para a mãe de JC.

No delírio beato, JCN atribui ao cristianismo «os fundamentos dos direitos humanos, a igualdade entre todas as pessoas e a libertação da mulher» - um exercício de falsificação histórica e de manipulação da verdade, confundindo cristianismo e Revolução Francesa.

JCN diz que uma «versão revisionista da História esforça-se por representar as eras cristãs como séculos de obscurantismo e barbárie, extrapolando para o todo de alguns casos aberrantes».

Podia lembrar a época actual, a luta da ICAR contra o preservativo, a homofobia, o apoio aos ditadores, a perseguição a teólogos progressistas, a negação do direito ao divórcio, a tibieza em relação à pena de morte, a censura de livros e filmes, a luta contra a liberdade religiosa (impondo o ensino obrigatório da sua no ensino oficial), enfim, um nunca mais acabar de horrores que tem na seita Opus Dei o seu expoente máximo.

Algumas frases são de fino recorte intelectual: «O que interessa ao culto actual de Madalena é directamente a cópula. Nossa Senhora é mulher, esposa, mãe. Tem todos os elementos femininos, mas é virgem. Isso mostra como vivemos num tempo obcecado pelo aspecto sexual no seu sentido mais venéreo. Sem o coito uma mulher não é mulher».

Claro que uma mulher é mulher sem o coito, mas há dois mil anos era o único método de engravidar e, ainda hoje, é o mais popular para dar prazer e gerar filhos.

Vale a pena ler todas os desvarios místicos de JCN. Quem não se comoverá com a festa da Assunção de Nossa Senhora que hoje, 15 de Agosto, tem lugar?

«Proclamado por Pio XII em 1950, este é o quarto dogma mariano da história da Igreja, depois da Maternidade de Deus no concílio de Éfeso em 431, da Virgindade Perpétua em 649 e da Imaculada Conceição de 1854». Uma fonte de erudição e de humor.

Sobretudo esta da «virgindade perpétua» deu cabo de mim. Vejam, leitores, como pode a fé ensandecer um créu.

Não percam «Um tempo salvo por uma mulher», de JCN, no Diário de Notícias.




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