sábado, março 11, 2006

 

Fundamentalismo cristão em Inglaterra

Num país em que escolas públicas confessionais são uma realidade não é de estranhar que grassem fundamentalismos sortidos. De facto, a estrita separação da res pública e da religião é condição sine qua non para o combate à praga anacrónica do século XXI, o terrorismo religioso.

De Inglaterra chegam-nos notícias que confirmam não ser apenas o fundamentalismo (e concumitante terrorismo) assente no Corão que importa combater, o fundamentalismo cristão, de forma menos mediática e violenta, é uma ameaça para a paz e para a democracia que não se pode descurar.

Uma dessas notícias é para mim extremamente preocupante e tem a ver com a introdução subreptícia do criacionismo nos curricula de ciências britânicos. Assim, a OCR admitiu que o novo curriculum de um curso de biologia a ser introduzido em Setembro encoraja as escolas a apresentar versões alternativas, incluindo criacionismo e desenho inteligente, à teoria da evolução para, supostamente, indicar aos alunos que há controvérsia «científica» sobre o tema (o que não é verdade, há discussão sobre os mecanismos operantes na evolução mas não há quaisquer controvérsias sobre a evolução de per se).

Como afirmou James Williams, da Universidade de Sussex «Isto abre uma porta legítima para a inclusão do criacionismo ou do desenho inteligente nas aulas de ciências como se fossem teorias legítimas a par do facto da evolução e das teorias [que a explicam]». Continuando, «Acho bem que teorias religiosas [criacionismo e desenho inteligente] sejam consideradas em educação religiosa mas não em ciência, onde considerá-las pode conduzir a uma falsa confirmação do seu estatuto como iguais a teorias científicas».

Outra notícia preocupante tem a ver com a campanha de ódio movida contra uma enfermeira galardoada esta semana com o título «Enfermeira do Ano» pelo ministério da Saúde britânico, pelo seu trabalho em saúde reprodutiva, nomeadamente no auxílio psicológico que presta a mulheres na fase pós-aborto. A organização UK LifeLeague, muito activa igualmente contra a transmissão pela BBC do espectáculo de Jerry Springer, apelou ao uso de tácticas terroristas semelhantes às que usou contra o director da BBC. Assim, publicou um press release divulgando o número de telefone e morada da enfermeira (como já tinha feito em relação a Mark Thompson, director da BBC) e pediu aos fundamentalistas cristãos que a contactem em casa e a façam sentir que «o único prémio que merece é prisão perpétua».

A UK LifeLeague foi fundada em 1999 e, como é declarado na sua página de entrada, «acredita que o debate e argumentação não conseguirão os resultados necessários [proibir o aborto]». Como tal, e na linha totalitária expectável de qualquer religião, considera perfeitamente legítimo impôr os seus dogmas religiosos por outras formas de acção, nomeadamente campanhas de ódio como as que tem promovido. Nos Estados Unidos, onde movimentos como a LifeLeague são em muito maior número e existem há mais anos, alguns paladinos de óvulos e espermatozóides levaram essas campanhas a extremos de violência contra os que acreditam no direito à escolha que incluíram o assassínio de vários médicos e o ataque bombista de clínicas. Tudo em nome da defesa intransigente da vida...




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